quarta-feira, 10 de fevereiro de 2016

Mudanças significativas no ensino superior: quem viver, verá.

04/02/2016 -

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Educação
Artigo escrito por Fábio José Garcia dos Reis* 
As organizações erram quando não percebem que há mudanças significativas nos ambientes em que atuam. A História nos ensina que as organizações que mais rápido se adaptam às novas realidades econômicas, sociais, culturais, tecnológicas e de concorrência obtiveram sucesso.
As instituições de ensino superior (IES) são organizações acadêmicas que, ao longo do tempo, demonstram resistências às mudanças, em função da fragilidade das lideranças, da postura conservadora perante as novas realidades, do corporativismo acadêmico e da permanência de concepções de “universidade” elaboradas no século XIX e início do XX. É que preciso repensar essa concepção e atualizá-la, em função da dinâmica do século XXI.
Há anos leio, visito IES no Brasil e em diversos lugares no mundo e converso com pessoas que se dedicam a pesquisar o ensino superior. Fui instigado a escrever esse texto, após algumas leituras interessantes. Eu gostaria de sugerir a leitura de livros de diferentes autores (inclusive de correntes de pensamento divergentes). Recomendo a leitura de “Universidade em ruínas na república dos professores”, organizado por Hélgio Trindade; “Dinossauros, gazelas e tigres”, organizado por Victor Meyer e J. Patrick; “A aventura na universidade”, de Cristovam Buarque, “A universidade inovadora: mudando o DNA do ensino superior de fora para dentro”, de Clayton Christensen e Henry Eyring; “Ensino híbrido”, organizado Lilian Bacich, Adolfo Neto e Fernando Trevisani; “Los nuevos modelos universitários en América Latina”, de Claudio Rama, “Guiar el Mercado”; organizado por José Joaquin Brunner, “Sustaining change in Universities”, de Burton Clark; “Change.edu, rebooting for the new talent economy” de Andrew S. Rosen; “The end of college: creating the future of learning and the university of everywhere”, de Kevin Carey e“Organizações sustentáveis na educação superior”, organizado por Fábio Reis. São livros que discutem as mudanças e as novas dinâmicas no ensino superior e apresentam cases de IES que realizaram mudanças significativas.
Farei comentários sobre alguns artigos dos últimos três livros indicados. Maurício Garcia escreveu um capítulo no livro sobre organizações sustentáveis, lançado em setembro de 2015. O título é “Estamos na terceira onda do ensino superior?”. Garcia fez algumas afirmações em que ele previa que “o grande ativo das instituições no futuro não será seu material didático, nem seu corpo docente. Será sua capacidade de ter uma comunidade virtual engajada” (…) “o que os grandesproviders de conteúdo virtual do mercado vão fazer? Hoje, quando discutimos educação, falamos sobre instituições de ensino superior. Mas… e quem não é uma instituição? O que pode significar se o Google quiser entrar no mercado de educação? Ou a Apple? Ou a Amazon? Ou seja, se, em vez de serem providers, eles quiserem ser players?”.
Ao abrir o meu e-mail, no último final de semana de janeiro de 2016, deparo-me com uma mensagem (enviada para algumas pessoas) de Maurício Garcia com o título  “How Amazon could destroy college as we know it?” (http://www.vox.com/2016/1/27/10835038/amazon-higher-education). Garcia enviou um link com um artigo publicado por Alexander Holt, em que o fundador e CEO da Amazon, Jeffrey Bezos prevê que “ the future of Amazon University is Strong as we continue to become the first truly global university. As our alumni network and reputation with customers and employers grow, we predict increasing demand for our services. We are excited about the future of a more educated, less indebted citizenry”. Bezos projeta uma Universidade global que tenha como princípios acesso, qualidade, baixo custo e tecnologia.
A capacidade de inovação e de soluções tecnológica de empresas como Amazon, Apple e Google é muito superior a das nossas IES. Garcia termina o capítulo afirmando que “tudo indica que ainda teremos grandes mudanças pela frente, mas é difícil prever” (set/2015). O e-mail (jan./2016) termina com a seguinte frase “quem viver, verá”. Caro leitor, o que você pensa sobre as questões colocadas por Garcia? Quais seriam as estratégias diante dessa nova realidade? Hoje, estamos preocupados com financiamento, com a concorrência e com a atuação dos grandes grupos educacionais. Caro leitor, além de todas essas preocupações, você já projetou a sua IES para 2020 e já começou o desenho para 2030?
Eu ganhei o livro “Change.edu”, de Antonio Carbonari. Quem atua no ensino superior sabe que ele é um dos empreendedores do setor. Carbonari fez a seguinte afirmação, quando me entregou o livro: “Fábio, sei que você estuda tendências educacionais, aqui está um livro sobre o futuro do ensino superior”. No ultimo capítulo, “The learning playbook: 2036 and coming twenty-five years of change in higher education”, Andrew Rosen aponta sete tendências: 1) os sistemas educacionais serão mais Mobile e os avanços tecnológicos vão permitir que as diversas formas de ensino online tornem-se superiores ao do ensino unicamente face to face, em número de matriculados e em qualidade. Os nichos face to face vão permanecer; 2) o ensino será mais desagregado ou fragmentado, pois os estudantes vão querer vivenciar diversas experiências de aprendizado, via cursos abertos e cursos específicos, por exemplo. Os estudantes vão optar por escolas flexíveis em seu modelo curricular; 3) o ensino será mais personalizado, pois os estudantes vão fazer opções de trajetória, na formação escolar. Eles irão para a escola e terão a oportunidade de construir a sua carreira de graduação, a partir de diferentes possibilidades temáticas. O professor será um coach, um mentor que orienta o aprendizado, uma pessoa que ajudará os estudantes a elaborarem seus projetos e seus objetivos de aprendizado; 4) haverá um foco maior na avaliação da aprendizagem. Haverá mais preocupação com o engajamento dos estudantes, com a eficiência do aprendizado e com as estratégias que possibilitam os estudantes aprenderem. O crucial será tornar o aprendizado algo significativo; 5) a educação será mais acessível, o que permitirá pessoas de diferentes culturas e lugares do mundo terem acesso a ofertas educacionais com custo menor e com qualidade reconhecida pelos agentes reguladores e pela sociedade; 6) o ensino será mais global, em função do avanço do ensino virtual, das redes de cooperação, das facilidades de deslocamento das pessoas e da própria presença de novos players nos sistemas educacionais; 7) o ensino será mais agradável e interessante, o que favorecerá o engajamento dos estudantes. Dispositivos eletrônicos, diversidade de aplicativos, games, aprendizagem ativa em ambientes virtuais, entre outros processos facilitados pela tecnologia tornarão a educação menos burocrática, repetitiva e desmotivadora.
Em “The end of College”, Kevin Carey, ao escrever sobre a universidade de qualquer lugar, acredita que o ensino superior move rapidamente para o modelo híbrido, em que os estudantes não deixarão de ir para as IES em alguns dias durante a semana ou mês. Os recursos educacionais estarão disponíveis em ambientes virtuais, de forma ampla. Carey acredita que as IES vão manter links de cooperação para viabilizar a troca de recursos acadêmicos que colaboram com o aprendizado dos estudantes. A ideia de admissão será anacrônica, pois o ensino superior será aberto e acessível. As IES estarão abertas para qualquer pessoa, de qualquer lugar. Ele cita os exemplos de MIT e Harvard, que disponibilizam cursos e recursos educacionais gratuitamente.
Kevin acredita que as IES vão oferecer diversos tipos de cursos de formação e em função da flexibilidade e da mudança do conceito de currículo, os estudantes poderão compor sua formação de graduação, em diferentes instituições. Os ambientes de aprendizagem serão sofisticados e personalizados, portanto, as informações sobre a vida acadêmica do estudante, sobre suas dificuldades de aprendizado e sobre suas experiências pedagógicas na instituição serão acompanhadas por plataformas de aprendizagem com alta capacidade de gerar informações sobre a vida acadêmica dos estudantes.
As pessoas tendem a manterem-se matriculadas em uma ou mais instituição ao longo da vida, pois haverá uma percepção de que será necessário aprender a aprender continuamente. As IES deverão tornarem-se especialistas em relações entre as pessoas e terão que facilitar e instigar o relacionamento das pessoas. A diversidade terá que ser respeitada.
Os ambientes de aprendizagem vão mudar de forma significativa. A “Universidade de qualquer lugar” terá centros de ensino e aprendizagem interdisciplinar, em que as pessoas vão engajar-se em projetos significativos e criar redes de cooperação e aprendizado coletivo. Nesse contexto, o papel do professor irá mudar radicalmente, da mesma forma, a tecnologia vai impactar de forma significativa a forma como nós conhecemos o ensino superior hoje.
Caro leitor, procurei juntar todas as reflexões propostas pelos autores dos livros que apresentei e fiz um breve panorama. Eu não tenho dúvida de que haverá mudanças significativas no ambiente do ensino superior, que vão além da aprendizagem e das metodologias ativas.
As IES que não conseguirem perceber as novas realidades tornar-se-ão obsoletas e perderão sua competitividade. Cabe aos líderes institucionais serem os agentes da mudança organizacional, para que a IES possa realizar as transformações que a tornem contemporânea e alinhada com as dinâmicas do século XXI, sem cair na armadilha dos modismos e da perda de sua identidade e de seu papel social. Ele apresenta de forma transparente as perspectivas institucionais.
Os bons líderes de IES possuem a capacidade de se manterem atentos aos resultados financeiros e acadêmicos do presente sem deixarem de estar sintonizados com o que há de relevante no ensino superior. Nós, líderes e estudiosos do ensino superior, precisamos estar atentos ao que estar por vir. Se a previsões de mudanças citadas acima se concretizarem, teremos um ambiente de ensino superior bem diferente do que temos hoje. Como escreveu Garcia, “quem viver, verá”.

*Fabio Reis é Licenciado em História pelo Centro Universitário Salesiano de São Paulo (UNISAL). Doutor em História Social pela Universidade de São Paulo (USP). Professor e Diretor do Centro UNISAL, Unidade de Lorena. Dedica-se à pesquisa sobre as tendências da educação superior e os modelos de governança e gestão das IES, além de ser colaborador do Instituto Expertise de Educação e do SEMESP, na organização de seminários, fóruns e missões internacionais focados na formação de lideranças para a gestão de IES e na inovação acadêmica.
**Maurício Garcia é Vice-Presidente Acadêmico da DeVry Brasil e uma pessoa engajada no debate sobre a dinâmica do ensino superior do Brasil.

sexta-feira, 5 de agosto de 2011

Conclusões do grupo

Gustavo, André e Daniel

Tendo em vista a questão de pesquisa do nosso blog, “Porque os discentes optam pela Tendência Pedagógica Tradicional/Tecnicista”, procuramos identificar e entender os motivos pelos quais os acadêmicos do curso de Engenharia optaram por esta tendência segundo a pesquisa realizada.

Destacamos alguns textos que servem de base para tal explicação, pois é preciso entender que as concepções epistemológicas do professor norteiam a sua ação docente em sala de aula e as condições sociais, culturais, religiosas do aluno influenciam no processo ensino-aprendizagem. Desde a alfabetização a pedagogia diretiva empregada, norteia o processo de forma que o professor constitua a representatividade máxima, sendo ele o elemento que conduz a palavra e as atividades. O aluno escuta, copia e executa, obedecendo ao comando do professor. Temos que levar em conta que um dia este professor que hoje ensina, também foi aluno e talvez foi ensinado pela mesma pedagogia e autoritarismo.

Quando refletimos sobre o ensino universitário, do curso de Engenharia, como apresentado pela pesquisa, nos deparamos com as mesmas deficiências, ou seja, os professores empregando a mesma pedagogia tradicional, não sendo surpreendente que os alunos involuntariamente aderem ao sistema. Na relação ensinar-aprender existe uma expectativa por parte de ambos, e a universidade como instituição social tem influência no comportamento dos sujeitos.

A forma como o professor emprega os métodos que visam a aprendizagem é determinante na construção do conhecimento do aluno. Trazer para a sala de aula novas experiências, novas tecnologias e estimular a participação dos alunos explorando suas potencialidades individuais e de grupo, para que os mesmos sejam parte ativa no processo de aprendizagem, transforma a sala de aula em um ambiente positivo atendendo os anseios do aluno e contribuindo para a sua formação profissional e pessoal.

Fica evidente que os professores e alunos devem interagir como verdadeiros construtores de disciplinas, num processo evolutivo, transformando a tendência pedagógica tradicional em um ambiente de ensino-aprendizagem colaborativo. Neste ambiente de constante aperfeiçoamento, a Universidade deve contar com o apoio de técnicas de comunicação e ferramentas de ensino.





terça-feira, 5 de julho de 2011

Educação em Engenharia: algumas idéias e a semente para um projeto possível

Síntese do artigo:
Revista de Ensino de Engenharia


Marcius F. Giorgetti





A partir da reforma de 1968, o sistema universitário oficial estruturou-se, ou tentou se estruturar, segundo o modelo das universidades de pesquisa norte-americanas. Nesse processo, a atividade de pós-graduação ganhou grande prevalência sobre a de graduação. Juntamente com as inegáveis vantagens trazidas por essa reforma, foram importadas também algumas desvantagens para a educação do engenheiro.

No Brasil, esse fenômeno aconteceu nas escolas de engenharia, tanto em IESs oficiais, que foram as primeiras a sentir, intramuros, a influência da pós-graduação, quanto no sistema privado, diante da leitura inapropriada do estímulo oficial pró-titulação, nem sempre acompanhada da necessária qualificação apropriada para o exercício da docência.

Uma autocrítica interessante feita nos Estados Unidos por uma comissão de líderes educacionais, coordenada pelo eminente professor Ernest L. Boyer, parte de uma pergunta bastante agressiva antes de oferecer as suas recomendações: “As instituições de ensino e pesquisa estão enganando os seus estudantes?” A conclusão, embora rebatida por alguns críticos, foi que as universidades de pesquisa frequentemente dedicam atenção insuficiente ao ensino de graduação,concentrando- se principalmente na pesquisa e nos programas de pós-graduação. O relatório “Reinventando a educação de graduação: um projeto para as universidades de pesquisa dos Estados Unidos” incentiva as universidades de pesquisa a instituírem um novo modelo educacional, que tire proveito dos imensos recursos dos programas de pós-graduação e pesquisa para estruturar experiências de aprendizagem ativa para os estudantes de graduação.”

“Recomendações do Relatório Boyer para as universidades de pesquisa"

O relatório da Comissão Boyer, “Reinventando a educação de graduação: um projeto para as universidades de pesquisa dos Estados Unidos”, recomenda que as universidades de pesquisa adotem as dez práticas seguintes:

1. Adote como padrão a aprendizagem baseada na investigação;

2. Construa um primeiro ano baseado no questionamento;

3. Edifique sobre a fundação desse primeiro ano;

4. Remova as barreiras à educação interdisciplinar;

5. Associe habilidades de comunicação às atividades do curso;

6. Use a tecnologia da informação de forma criativa;

7. Inclua uma experiência de síntese;

8. Treine os estudantes de pós-graduação como aprendizes de docência;

9. Altere o sistema de promoção do corpo docente;

10. Cultive um senso de comunidade.”

Caminhos alternativos




Além do potencial complicador das diferenças de desenvolvimento cognitivo entre alunos das escolas maiores e das escolas menores, há outros fatores a considerar.

Por exemplo, estudantes de cursos noturnos que trabalham durante o dia todo têm muito pouco tempo para estudar fora da escola. Portanto, não adianta apenas dar aula com o objetivo de esgotar todo o programa, com a esperança de que os alunos estudarão em casa. É preciso que as atividades sejam dimensionadas e distribuídas de forma compatível. O tempo de contato em sala de aula precisaria, idealmente, ser usado como um ato educacional completo, compreendendo motivação, conexão com o material didático estudado anteriormente, exposição à nova informação, construção do conhecimento, exercício no uso do conhecimento construído e conclusão.

Para isso os programas precisam ser dimensionados (e/ou abordados) de forma adequada. Uma estratégia que venho usando com bastante sucesso nos cursos que tenho coordenado, mesmo com o uso de ementas e programas tradicionais, é a seguinte:
Estimulo os docentes a refletirem sobre cada disciplina que lecionam, identificando o que do programa é essencial e o que é cultural ou complementar. Normalmente, o resultado é do seguinte tipo: 30 a 35% do conteúdo são considerados essenciais. Minha sugestão: gaste 65 a 70% do tempo com a parte essencial do conteúdo e 30 a 35% do tempo com a parte complementar.



Conclusão



O autor está convencido de que é possível se conseguir uma enorme melhoria na qualidade da aprendizagem nos cursos menores de engenharia do país, mas acha que, para tanto, seria necessário um grande investimento no desenvolvimento de materiais didáticos apropriados, pedagogia apropriada e metodologias apropriadas. Paralelamente, os programas de pós-graduação precisariam participar dessa ação diagnóstica e de produção para se preparar para a incorporação do treinamento adequado dos futuros docentes, a maioria deles destinada às escolas com cursos menores.
O benefício seria incalculável, pois viria a atingir, com o potencial aumento de eficácia educacional,85% dos estudantes do país.

segunda-feira, 4 de julho de 2011

Docência no Ensino Superior: Questões e Alternativas

Síntese:

Revista Educação

Beatriz T. Daudt Fischer



- Há dois pressupostos aceitos comumente na academia:

1. A universidade é frequentada por adultos e adultos sabem o que querem, portanto o professor no ensino universitário não precisa preocupar-se com a pedagogia;

2. Para dar aula, o que o professor precisa é simplesmente dominar o conteúdo e ter uma boa comunicação.

- Algumas questões:

1. Faz sentido acompanhar um raciocínio (o do professor) para resolver um problema muitas vezes fora de contexto (Um dia vocês irão entender a razão de estarem estudando este conteúdo)?

2. Há significado em vir à aula para constatar dados numa tabela (interpretada pelo professor)? Qual o interesse em ouvir narrativas textuais que poderiam ser lidas em casa?

3. De fato, se assim tem sido, há que refletir se muitos estudantes não tem razão ao mostrarem-se desinteressados, frequentando as aulas na universidade simplesmente pela certificação?

4. Em quais dimensões efetivamente o aluno cresce, se suas experiências se limitam a ouvir e ver, ver e ouvir, depois reproduzir?

5. Muitas vezes as tarefas acadêmicas tem contribuído mais para o desencanto em relação ao conhecimento do que para seu incentivo e produção. Assim, com raríssimas exceções, à medida que os estudantes somam anos de escolaridade diminuem a curiosidade, o gosto por desafios intelectuais e, o que é pior, a criatividade latente.

6. A universidade não deveria ser o locus privilegiado para despertar capacidades adormecidas ao longo da trajetória escolar?

7. Não seria a etapa da graduação um tempo em que o estudante poderia se defrontar com desafios instigantes? Onde pudesse se deparar com alguns inusitados, com alguns aparentes inexplicáveis?

8. Não seria a universidade um dos espaços mais adequados para discussões coletivas, problematizações e busca de soluções originais para o campo profissional e para a sociedade em geral?

Uma das principais razões da prática docente na universidade seria fazer pensar, buscar soluções para novos problemas, descobrir alternativas originais diante dos enfrentamentos teóricos e práticos. Afinal esta a finalidade principal, o motivo primeiro em “dar aula” - aula instigante - na universidade.

- Contrapontos:

Em primeiro lugar, na nossa realidade universitária atual, embora adultos façam parte do conjunto da sala de aula, são os jovens que ultimamente dominam as estatísticas. A cada ano, jovens cada vez mais jovens. Será que sabem o que querem? E, digo mais, ainda que somente alunos adultos constituíssem este cotidiano, ainda assim não se justificaria que um professor menosprezasse a dimensão pedagógica, inerente a qualquer processo de ensino, independentemente do nível em que ele atue.

Em segundo lugar, analisando a dimensão histórica (TRINDADE, 1999), já é pretérito o tempo em que a universidade ostentava alto status entre as instituições sociais, a ponto de bastar-se por si só. Ou seja, no passado o aluno aspirava tanto chegar ao espaço universitário que, ao conseguir atingi-lo, bebia sofregamente os saberes advindos daqueles mestres, a ponto de dispor-se a ouvi-los com reverência e admiração. Hoje, ainda que a disputa por uma vaga seja mais concorrida, a postura do aluno é outra. Mudaram os alunos, mudaram os mestres, mudou a vida.

Argumento, aqui, em favor de uma concepção de conhecimentos que supõe, entre outros fatores, a relação sujeito (aluno)-objeto (conteúdo), numa interação dinâmica e permanente, que se torna sempre mais rica e efetiva de acordo com a atitude de mediação do professor. Rejeita-se a concepção tradicionalmente aceita que entende ensinar como “transmitir conhecimento”, ou que compreende conhecimento como algo acabado, produto definitivamente pronto, esperando apenas ser transmitido de alguém que “sabe” para quem “não sabe”.


Como anedota costuma-se dizer que, entendido dessa forma, o conhecimento faz o seguinte trajeto: livros + produções de intelectuais + relatórios de pesquisa –> cabeça do professor -> fala do professor + quadro e giz -> caderno dos alunos –> provas e exames. Ou seja, neste percurso não há espaço para o processo ativo do aluno, ou para desafiar a inteligência do estudante, uma vez que cabe a ele apenas reproduzir o que já está dado.


-Reflexão:


Pensar a dimensão pedagógica do trabalho docente não pode limitar-se ao pensamento didático restrito, equivocado, do tipo “como elaborar um roteiro de aula”. Pensar o trabalho docente sob a perspectiva pedagógica supõe, antes de mais nada, redimensionar o contexto da sala de aula, a partir de, pelo menos, três considerações:

A primeira referente ao plano filosófico/ético/político, quando se busca indagar e responder acerca do sentido do que se faz na universidade, refletindo em torno do compromisso e finalidades dessa instituição na sociedade hoje.

A segunda diz respeito ao plano epistemológico/curricular/didático, que exige reflexões específicas referentes ao curso em que se atua, aos critérios para definir conteúdos e procedimentos operacionais, bem como ao ato de aprender em si, redefinindo (como já falei anteriormente) a própria concepção do que se entende como conhecimento.

A terceira consideração aponta para aspectos de ordem psicológica, atingindo questões específicas das relações interpessoais, das subjetividades, do jeito de ser de cada um, das possibilidades e possíveis restrições dos sujeitos envolvidos no cenário da sala de aula.

Ensinar é, certamente, provocar o crescimento intelectual e isso não se faz através de aulas onde, ao longo do semestre, só o professor fala e/ou faz demonstrações no quadro. Aprender não significa acumular informações memorizadas e sem sentido. Aprender, efetivamente, significa que o aluno, diante de situações novas, é capaz de buscar alternativas argumentando teoricamente em favor de suas escolhas.

Portanto, estimular intelectualmente o aluno exige fazê-lo romper com explicações dos outros, supõe provocá-lo para que ele busque as suas próprias, ou seja, supõe desafiá-lo à autonomia de pensamento. Por isso, professores que conseguem instigar os estudantes para a pesquisa (BEHRENS, 2003) encontram um dos caminhos mais seguros para, efetivamente, alcançar tais resultados.

A arte mais importante do mestre é a de fazer brotar a alegria no estudo e no conhecimento. O professor só pode esperar atingir o seu público na medida em que ele próprio é atingido por esse público; na medida em que o percebe enquanto desejo ativo e se sente enriquecido por ele (EINSTEIN, apud SNYDERS, 1995).

domingo, 3 de julho de 2011

A COMPLEXIDADE DO TRABALHO DOCENTE NA ATUALIDADE

A COMPLEXIDADE DO TRABALHO DOCENTE NA ATUALIDADE
Jussara Bueno de Queiroz Paschoalino
Mestre em Educação – UFMG

O professor inserido na dinâmica capitalista e com o avanço dos meios de informação tem se posicionado no lugar da perda e do mal-estar docente. As alterações significativas do papel do professor deixam marcas de sofrimento no docente, que possibilita constatar um distanciamento entre os ideais da profissão e a realidade profissional. O isolamento docente no seu espaço de trabalho proporciona sua fragilidade diante de um panorama de culpalização que altera significativamente seu desempenho profissional.
Sócrates, traz como modelo da arte de ensinar uma íntima correlação com a arte
de persuadir. O papel do professor era seduzir pelo conhecimento as mentes dos jovens.
Hoje, ao se eximir de olhar a situação com a complexidade que ela exige os
professores, isolados em suas escolas, sofrem com a intensificação das cobranças e
sentem-se frustrados diante do pouco êxito de seu trabalho. Dessa forma, o próprio
professor também
[...] tende a se culpar desde seus primeiros enfretamentos com a realidade cotidiana do magistério, porque em muito pouco tempo descobre que sua personalidade tem muitas limitações que não se encaixam no modelo de “professor ideal”, com o qual se identificou durante o período de formação inicial. (ESTEVE, 1999, p.50).

Os professores, perdidos por não sentirem reconhecidos financeiramente pelo trabalho que realizam, investem na sua formação e, mesmo assim, não conseguem o retorno esperado no aspecto econômico.
Assim, o professor sofre por não conseguir vivenciar as expectativas em relação ao seu trabalho, associadas às características das dimensões de persuadir, de encantarseu aluno no conhecimento, pela fé no outro e de ter a vocação para a difícil, “impossível” (FREUD, 1969), a tarefa de ensinar.
Conseqüentemente o professor, sujeito dessas intensas interações no seu trabalho, também passa a estar em permanente contato com os problemas e as insatisfações do mundo em que vivemos.
Considerações
A complexidade do trabalho do professor na contemporaneidade precisa ser analisada como uma matéria estrangeira, pois, está embrenhada de significados construídos ao longo do tempo.
O ideal da profissão está posto no imaginário do coletivo, porém a realidade atual desconserta constantemente esses profissionais, que buscam realizar bem o seu papel de
professor.
As cobranças frente ao fracasso escolar interrogam o papel do professor impondo lhe
uma culpa sem uma análise mais profunda da educação que se espera hoje. Assim, o
professor frágil e sem o apoio do coletivo, se percebe no isolamento e impregnado de
um sentimento de culpa.
A culpa sentida pelo professor diante do seu trabalho provoca diversos mal-estares,
que influencia diretamente no seu trabalho estabelecendo um círculo vicioso de
descontentamento.
Os conhecimentos da ergologia possibilitam o revisitar a história profissional do trabalho docente, entremeada das relações, que possibilitaram diversas renormalizações,
diante das infidelidades do meio, num processo de construção coletiva do trabalho
docente.
As reflexões sobre esse estudo analisam a necessidade de possibilitar esse profissional um espaço de interlocução, para que saia desse isolamento de seu trabalho e possa construir ressignificados para o seu papel na realidade.

TENDÊNCIA AO ENSINO COLABORATIVO

MUDANÇAS NO CONTEXTO DO ENSINO SUPERIOR NO BRASIL: UMA TENDÊNCIA AO ENSINO COLABORATIVO
Nelson Colossi; Aldo Consentino; Etty Guerra de Queiroz
Rev. FAE, Curitiba, v.4, n.1, p.49-58, jan./abr. 2001

Trata-se da “era da incerteza”, conforme denominou GALBRAITH (1976) ou, ainda, da “era de descontinuidade”, como classificou DRUCKER (1974).
PANORAMA GERAL
A educação é um processo social que muitas vezes envolve grupos pequenos, como a família, ou grandes, como a comunidade. Segundo LEWIN (1965), é muito mais fácil o grupo mudar a educação do que a educação mudar a sociedade.
Institucionalmente, são três as finalidades do ensino: contribuir na formação da personalidade do educando, tanto do ponto de vista físico quanto ético; oferecer-lhe consciência de seu papel na sociedade para o devido exercício da cidadania; e ministrar-lhe os ensinamentos exigidos em nossos dias, possibilitando-lhe acesso aos postos de trabalho, num sistema de produção cada vez mais automatizado.
A EDUCAÇÃO SUPERIOR COMO INSTITUIÇÃO SOCIAL
Nas raízes da expansão do ensino superior, observa-se a predominância dos critérios de busca de atendimento de necessidades voltados para o mercado, ou seja, prevalecem critérios econômicos. Ocorre, assim, a comercialização do ensino superior, a predominância de critérios utilitaristas, com o prejuízo de ações que privilegiem os aspectos sociais e o atendimento aos interesses de um pequeno grupo.
A educação superior é uma instituição social, cujo papel fundamental é formar a elite intelectual e científica da sociedade a que serve. É, acima de tudo, um ideal que se destina, enquanto integrador de um sistema, à qualificação profissional e promoção do desenvolvimento político, econômico, social e cultural.
A UNIVERSIDADE DO PRÓXIMO MILÊNIO: ENSINO COLABORATIVO
Três ambientes distintos, caracterizam a universidade do novo milênio, conexão, colaboração e comunicação.
O ambiente conectivo possibilita conexões rápidas e flexíveis entre indivíduos, grupos e
sociedades. Já o ambiente colaborativo permite a utilização das conexões para a resolução conjunta de problemas e a produção de novos conhecimentos. E, por fim, o ambiente comunicativo permite a construção de um significado mútuo para os novos conhecimentos. Tais requerimentos tendem a promover uma mudança de regras, que transforma o professor de ‘sábio’ em ‘guia’, gerando, com isso, a necessidade de desenvolver habilidades ou competências para a gestão do conhecimento e para o trabalho em grupo. Tais especificidades propiciam a chamada aprendizagem cooperativa. Nesse caso, o professor transforma-se em condutor, em bandeirante ou desbravador de conhecimentos.
Desejam-se professores e alunos que interajam nesse ambiente colaborativo como verdadeiros construtores de disciplinas, num processo evolutivo que transforma
a disciplina, adequando-a às necessidades do ambiente. Os professores, atuando como verdadeiros tutores dos alunos, e os alunos, transformando-se de simples receptores passivos do conhecimento em solucionadores de problemas, construirão um todo
agindo diretamente na construção da disciplina e no perfil profissional dos alunos.

sexta-feira, 1 de julho de 2011

A FORMAÇÃO DO PROFESSOR DE ENGENHARIA
Cláudia Angélica do Carmo Reis - claudiareis@adm.cefetmg.br
Centro Federal de Educação Tecnológica de Minas Gerais
http://www.senept.cefetmg.br/galerias/Arquivos_senept/anais/terca_tema3/TerxaTema3Artigo11.pdf
... segundo levantamento feito pelo INEP, no ano de 2006, o contingente de professores atuando no ensino superior era de 252.040.
O padrão francês de universidade, modelo implantado no Brasil em 1808, contribuiu
para a manutenção de um perfil de professor que fosse competente no exercício da sua
profissão com formação no nível de bacharelado, pois, a atividade de ensinar consistia em ministrar aulas expositivas ou palestras sobre um determinado assunto (MASSETO, 1998).
A Lei de Diretrizes e Bases para a Educação Brasileira, LDB 9394/96, estabelece em
seu artigo 66, que “A preparação para o exercício do magistério superior far-se-á em nível de pós-graduação, prioritariamente em programas de mestrado e doutorado”. Essa mesma lei exigiu no mínimo 1/3 do corpo docente das Instituições de Ensino Superior, com a titulação de mestre e doutor. Posteriormente a CAPES instituiu a obrigatoriedade do estágio docente aos bolsistas dos programas de pós-graduação stricto sensu, porém, tal iniciativa é insuficiente para se garantir alguma formação pedagógica aos aspirantes à carreira do magistério superior, visto que o contingente de Pós-graduandos bolsistas ainda é muito pequeno.
Embora existam pontos convergentes favoráveis e necessários entre os processos de
ensino e pesquisa, é preciso empreender a tarefa de evidenciar ao professor pesquisador essa interface, pois, a docência e a pesquisa “comportam dois universos de significação que se entrecruzam, mas não necessariamente se mostram como totalmente superpostos” (GATTI, 2003, p. 75).
Percebe-se que os saberes específicos do conteúdo são mais valorizados em detrimento dos saberes da docência e que a pesquisa acaba recebendo maior atenção por parte de alguns docentes: “o ensino acaba sendo considerado puramente a transmissão de conhecimentos e visto como uma atividade secundária” (ISAIA, 2006).
Essa situação agrava-se ainda mais para os professores que atuam na pós-graduação,
pois o modelo de avaliação da CAPES e seus indicadores de qualidade, com crescente ênfase nos elementos quantitativos (MORAES, 2006), mobilizam os professores universitários à intensa produção de conhecimento em sua área específica ficando a atividade de ensinar fora do foco de análise e reflexão desses professores.
Além disso, a docência universitária está sob diferentes condicionantes dependendo
do tipo de instituição na qual a função docente é exercida, seja em Centros universitários, Faculdades ou Universidades, públicas ou privadas, que estabelecerão diferentes regimes de trabalho com o professor, que poderá ser dedicação integral, parcial ou horista.
A realidade da docência universitária no Brasil é complexa e precisa ser problematizada simultaneamente à reflexão sobre a formação do professor no ensino superior, sob pena de situarmos o professor na polêmica polarização entre a vitimização ou a culpabilização pelas “querelas” do ensino.

Ensino de engenharia:

Algumas dimensões do ensino da engenharia estão expressas nas Diretrizes Curriculares Nacionais do Curso de Graduação em Engenharia, conforme podemos observar na resolução CNE/CES 11 publicada em 11 de março de 2002, que em seu artigo 3º estabelece:
“O curso de Graduação em Engenharia tem como perfil do formando egresso/profissional o engenheiro, com formação generalista, humanista, crítica e reflexiva, capacitado a absorver e desenvolver novas tecnologias, estimulando a sua atuação crítica e criativa na identificação e resolução de problemas, considerando seus aspectos políticos, econômicos, sociais, ambientais e culturais, com visão ética e humanística, em atendimento às demandas da sociedade.”

BAZZO (2000), em seus estudos sobre o ensino tecnológico, considerou a formação
específica para a docência como questão fundamental para a melhoria da qualidade do ensino de engenharia, visando à superação de um modelo tradicionalista e conservador de ensino, herança do modelo positivista de ciência.
... o aluno é considerado um recipiente vazio de conhecimentos técnicos e científicos. O professor é o detentor do conhecimento de quem se espera uma reprodução limpa e precisa das soluções clássicas, supostamente neutras e estritamente técnicas. O conhecimento já estruturado e compartimentalizado em suas diversas áreas, torna-se hermético, dogmático, dificultando a abertura para discussões estruturantes e fecundas à criatividade. Tal modelo vem sendo questionado pelo campo da educação, desde o
século XIX, não só por ser inadequado às exigências do mundo atual , já o era desde então, mas também pelo tipo de homem que forma: passivo, reprodutor do conhecimento, tolhido em sua autonomia, criatividade e crítica.
... No que diz respeito aos engenheiros-professores, acentua-se a necessidade de
diferenciação entre os objetos de trabalho no campo da engenharia e no campo da docência. BAZZO (1998) afirma que o professor de engenharia procura ratificar dentro da sala de aula a missão de representar o profissional-engenheiro mesmo atuando no sistema de ensino e dessa forma “ eles agem tratando o sistema ensino-aprendizagem da mesma forma como as regras não escritas da profissão cobram dele o tratamento dos seus objetos técnicos de trabalho”(BAZZO, 1998: 110).