segunda-feira, 4 de julho de 2011

Docência no Ensino Superior: Questões e Alternativas

Síntese:

Revista Educação

Beatriz T. Daudt Fischer



- Há dois pressupostos aceitos comumente na academia:

1. A universidade é frequentada por adultos e adultos sabem o que querem, portanto o professor no ensino universitário não precisa preocupar-se com a pedagogia;

2. Para dar aula, o que o professor precisa é simplesmente dominar o conteúdo e ter uma boa comunicação.

- Algumas questões:

1. Faz sentido acompanhar um raciocínio (o do professor) para resolver um problema muitas vezes fora de contexto (Um dia vocês irão entender a razão de estarem estudando este conteúdo)?

2. Há significado em vir à aula para constatar dados numa tabela (interpretada pelo professor)? Qual o interesse em ouvir narrativas textuais que poderiam ser lidas em casa?

3. De fato, se assim tem sido, há que refletir se muitos estudantes não tem razão ao mostrarem-se desinteressados, frequentando as aulas na universidade simplesmente pela certificação?

4. Em quais dimensões efetivamente o aluno cresce, se suas experiências se limitam a ouvir e ver, ver e ouvir, depois reproduzir?

5. Muitas vezes as tarefas acadêmicas tem contribuído mais para o desencanto em relação ao conhecimento do que para seu incentivo e produção. Assim, com raríssimas exceções, à medida que os estudantes somam anos de escolaridade diminuem a curiosidade, o gosto por desafios intelectuais e, o que é pior, a criatividade latente.

6. A universidade não deveria ser o locus privilegiado para despertar capacidades adormecidas ao longo da trajetória escolar?

7. Não seria a etapa da graduação um tempo em que o estudante poderia se defrontar com desafios instigantes? Onde pudesse se deparar com alguns inusitados, com alguns aparentes inexplicáveis?

8. Não seria a universidade um dos espaços mais adequados para discussões coletivas, problematizações e busca de soluções originais para o campo profissional e para a sociedade em geral?

Uma das principais razões da prática docente na universidade seria fazer pensar, buscar soluções para novos problemas, descobrir alternativas originais diante dos enfrentamentos teóricos e práticos. Afinal esta a finalidade principal, o motivo primeiro em “dar aula” - aula instigante - na universidade.

- Contrapontos:

Em primeiro lugar, na nossa realidade universitária atual, embora adultos façam parte do conjunto da sala de aula, são os jovens que ultimamente dominam as estatísticas. A cada ano, jovens cada vez mais jovens. Será que sabem o que querem? E, digo mais, ainda que somente alunos adultos constituíssem este cotidiano, ainda assim não se justificaria que um professor menosprezasse a dimensão pedagógica, inerente a qualquer processo de ensino, independentemente do nível em que ele atue.

Em segundo lugar, analisando a dimensão histórica (TRINDADE, 1999), já é pretérito o tempo em que a universidade ostentava alto status entre as instituições sociais, a ponto de bastar-se por si só. Ou seja, no passado o aluno aspirava tanto chegar ao espaço universitário que, ao conseguir atingi-lo, bebia sofregamente os saberes advindos daqueles mestres, a ponto de dispor-se a ouvi-los com reverência e admiração. Hoje, ainda que a disputa por uma vaga seja mais concorrida, a postura do aluno é outra. Mudaram os alunos, mudaram os mestres, mudou a vida.

Argumento, aqui, em favor de uma concepção de conhecimentos que supõe, entre outros fatores, a relação sujeito (aluno)-objeto (conteúdo), numa interação dinâmica e permanente, que se torna sempre mais rica e efetiva de acordo com a atitude de mediação do professor. Rejeita-se a concepção tradicionalmente aceita que entende ensinar como “transmitir conhecimento”, ou que compreende conhecimento como algo acabado, produto definitivamente pronto, esperando apenas ser transmitido de alguém que “sabe” para quem “não sabe”.


Como anedota costuma-se dizer que, entendido dessa forma, o conhecimento faz o seguinte trajeto: livros + produções de intelectuais + relatórios de pesquisa –> cabeça do professor -> fala do professor + quadro e giz -> caderno dos alunos –> provas e exames. Ou seja, neste percurso não há espaço para o processo ativo do aluno, ou para desafiar a inteligência do estudante, uma vez que cabe a ele apenas reproduzir o que já está dado.


-Reflexão:


Pensar a dimensão pedagógica do trabalho docente não pode limitar-se ao pensamento didático restrito, equivocado, do tipo “como elaborar um roteiro de aula”. Pensar o trabalho docente sob a perspectiva pedagógica supõe, antes de mais nada, redimensionar o contexto da sala de aula, a partir de, pelo menos, três considerações:

A primeira referente ao plano filosófico/ético/político, quando se busca indagar e responder acerca do sentido do que se faz na universidade, refletindo em torno do compromisso e finalidades dessa instituição na sociedade hoje.

A segunda diz respeito ao plano epistemológico/curricular/didático, que exige reflexões específicas referentes ao curso em que se atua, aos critérios para definir conteúdos e procedimentos operacionais, bem como ao ato de aprender em si, redefinindo (como já falei anteriormente) a própria concepção do que se entende como conhecimento.

A terceira consideração aponta para aspectos de ordem psicológica, atingindo questões específicas das relações interpessoais, das subjetividades, do jeito de ser de cada um, das possibilidades e possíveis restrições dos sujeitos envolvidos no cenário da sala de aula.

Ensinar é, certamente, provocar o crescimento intelectual e isso não se faz através de aulas onde, ao longo do semestre, só o professor fala e/ou faz demonstrações no quadro. Aprender não significa acumular informações memorizadas e sem sentido. Aprender, efetivamente, significa que o aluno, diante de situações novas, é capaz de buscar alternativas argumentando teoricamente em favor de suas escolhas.

Portanto, estimular intelectualmente o aluno exige fazê-lo romper com explicações dos outros, supõe provocá-lo para que ele busque as suas próprias, ou seja, supõe desafiá-lo à autonomia de pensamento. Por isso, professores que conseguem instigar os estudantes para a pesquisa (BEHRENS, 2003) encontram um dos caminhos mais seguros para, efetivamente, alcançar tais resultados.

A arte mais importante do mestre é a de fazer brotar a alegria no estudo e no conhecimento. O professor só pode esperar atingir o seu público na medida em que ele próprio é atingido por esse público; na medida em que o percebe enquanto desejo ativo e se sente enriquecido por ele (EINSTEIN, apud SNYDERS, 1995).

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